domingo, 26 de outubro de 2008

A importância da decepção para participação

Ontem comecei a ler um autor muito importante para minhas pretensões acadêmicas. Trata-se de Albert Hirschman. Seu livro De consumidor a Cidadão - atividade privada e participação na vida pública é uma espécie de "leitura obrigatória" para quem está interessado em formas de ação política na esfera da vida cotidiana, mais especificamente, no meu caso, na esfera do consumo.

É bastante interessante a abordagem que este autor imprime por introduzir a idéia de um ciclo privado-público-privado nas questões que envolvem a predisposição para a participação em sociedade. Hirschman é economista de formação e critica duramente o racionalismo neoclássico e a visão de soberania do consumidor. Além disso, sua abordagem investe na importância da decepção para entender os comportamentos coletivos e individuais de participação nas esferas pública e privada.

Em momentos eleitorais como o que acabamos de superar (e, por que não, de investir um resto de esperança que sobrou), creio ser relevantes as questões abordadas por Hirschman. Li apenas a introdução e o primeiro capítulo. Logo, estarei restrito a eles nesta postagem, com a esperança de continuar postando o restante do livro. Deste momento em diante, algumas várias notas acerca do conteúdo:

1. Questão central: nossas sociedades são de alguma forma predispostas a oscilações entre períodos de intensa preocupação com questões públicas e de quase total concentração no desenvolvimento e bem-estar individuais?

É este problema que Hirschman procura respostas no decorrer do livro, revelando de antemão contar com uma série de argumentos para defender a existência das oscilações. Ressalta ele a necessidade de comprovação do caréter endógeno para que um ciclo do comportamento coletivo possa ser construído. Isso significa que "a origem de uma fase se encontra necessariamente naquela que a precedeu".

2. O significado da dicotomia privado-público, no qual o autor distingue entre duas variedades de vida ativa: tradicional (se preocupa com as questões públicas) e interesse particular (busca de uma vida melhor para o indivíduo e sua família).

Neste sentido, cabe ressaltar a legitimidade social que o autor atribui à luta do indivíduo por seus interesses materiais particulares. O que Hirschman procura é por uma fenomenologia de engajamentos e decepções para explicar oscilações entre interesses particulares e ação pública e vice-versa.

3. A idéia básica de Hirschman: os atos de consumo, assim como os atos de participação em questões públicas, que são realizados porque se espera que gerem satisfação, também geram decepção e insatisfação. Algumas idéias aparecem:
- os seres humanos nunca estão satisfeitos.
- você nunca sabe o que é suficiente a menos que você saiba o que é mais que suficiente.
- errar é humano: errar é faculdade exclusiva dos humanos, apenas humanos erram.

4. A argumentação do autor foca na experiência do consumidor-cidadão individual ou, no máximo, na unidade familiar, donde surge o problema micro-macro. Ressalta-se que boa parte das atividades de consumo é tipicamente repetitiva, donde tira-se que uma decepção tende a produzir mudanças nos padrões de consumo e atividades que são tudo, menos "marginais". Com isso pretende criticar o realismo das teorias econômicas e sociológicas que tentavam dar conta da temática.

5. O mundo que o autor vislumbra compreender é "um mundo em que os homens pensam que querem uma coisa e, ao conseguí-la, descobrem, para seu desalento, que não a querem tanto quanto pensavam ou não a querem em absoluto e que alguma outra coisa, da qual tinham ciência mínima, é o que realmente querem".

6. Porém, Hirschman deixa claro que pretende se restringir apenas à mudança das metas de consumo privado para a atividade em interesse público e de volta àquelas.

Bem, está tarde e quando tiver tempo, tesão eu volto para comentar ou mesmo para dar seqüência...boa noite!!!

Um comentário:

Poesias Contos e Encontros disse...

Opa, amigo véio,
Percebi um comentário lá no blog dos poetas da Praça Mauá e vim parar aqui.
O blog não funciona mais, pois o grupo expirou. Mas uso de vez em quando para outros fins, de conta Google.
Fico feliz em saber de notícias suas, especialmente, foi uma boa surpresa chegar até este lugar virtual. Está super-bem-escrito, demonstra toda sua genialidade e profundidade de saber, como já tinha dado provas em tempos de facul. Ficam só os parabéns!
Forte abraço
Saudações.
Xandu